OS TEMPLOS


A azulejaria do Porto, recebe elevada expressão nos templos desta freguesia, falemos pois destes.

Existem nesta freguesia, além da Igreja Paroquial, as igrejas dos Congregados, Trindade e Recolhimento dos Órfãos.

A Igreja Matriz de Santo Ildefonso foi edificada em 1730. Havia ali uma ermida dedicada a Santo Alifon, mas por se encontrar em ruínas, construiu-se a actual igreja.
Possuiu um cemitério que lhe ficava contíguo, hoje inexistente.
As suas paredes são ornamentadas por pinturas de Paulo Sizzi.
A capela-mor foi delineada por Nicolau Nazóni, bem como os ricos armários da sacristia.

Na área desta freguesia há as capelas seguintes: Almas, Rua de Santa Catarina, Senhora da Boa Hora de Fradelos, Divino Coração e do Hospital de Santa Maria.

(Do «Dicionário corográfico de Portugal continental e Insular» de Américo Costa).

CAPELA NOSSA SENHORA DA BOA HORA

igr.fradelos.JPG (32925 bytes)No largo de Fradelos, em frente da fonte e lavadouros públicos de Fradélos, próximo da Rua de Santa Catarina. É um bonito templo e faz-se à sua padroeira uma boa festividade no dia próprio.
Tem uma irmandade, cujo rendimento anda por 280$00 reis anuais. Foi construída (ou reedificada) no princípio do Século XVIII.
Segundo a tradição, foi em tempos antigos, hospício de monges bentos, que para aqui mandavam os seus doentes, por ser Sítio saudável, então nos arrabaldes da cidade. Diz-se que desta circunstância lhe vem o nome de Fradéllos (o que é o mesmo que Fradinhos).

( Do livro «Portugal Antigo e Moderno» de Pinho Leal ).


CAPELA DOS PESTANAS

igr.pesta.JPG (31408 bytes)Dedicada ao Divino Coração de Jesus, foi mandada executar pelo engenheiro José Joaquim Guimarães é um curioso exemplar do estilo neogótico (1878-1888). Na frontaria, ladeando a torre, estão Colocadas as esculturas de S. José e S. Joaquim, de Soares dos Reis.

IGREJA DOS CONGREGADOS

igre.cong.JPG (29840 bytes)Provavelmente concluída em 1703, fez parte da Confraria de Santo António de Lisboa, já desaparecida.
A frontaria obedece à tradição barroca dos finais do século XVII combinando a austeridade com a imponência, embora apresente azulejos modernos, da autoria de Jorge Colaço, e vitrais executados no Porto, em 1929, por F. Mendes de Oliveira. O interior é de uma só nave. O coro, sobre a entrada, é suportado por três arcos que assentam em colunas jónicas. No transepto abrem-se dois portais de granito, barrocos.

Na capela-mor, decorada com painéis representando cenas da vida de Santo António, da autoria de Acácio Lino, pode admirar-se um retábulo neoclássico que enquadra algumas esculturas.

O frontal, o altar-mor e a banqueta de prata são obras de inspiração joanina executadas nos meados do século XIX.

Na sacristia - adaptação de um oratório dos congregados - conservam-se arcazes de pau-preto e uma tela, A Virgem e o Menino.

IGREJA DA CELESTIAL ORDEM DA SANTÍSSIMA TRINDADE

igreja.trind.JPG (21372 bytes)O autor do projecto foi o engenheiro militar Carlos da Cruz Amarante. No entanto, este projecto foi modificado, na fase de execução, pelo arquitecto João Francisco Guimarães, irmão trinitário, que veio a ser substituído durante as obras pelo professor de Arquitectura José Geraldo da Silva Godinho.

A Igreja da Trindade obedece ao gosto neoclássico de Carlos da Cruz Amarante, autor do primeiro projecto. Precede a fachada uma pequena mas larga escadaria entre os corpos do conjunto arquitectónico destinados aos serviços da Ordem Terceira. No primeiro piso rasgam-se três portas de arco pleno - a central com as armas da Celestial Ordem rematadas pela coroa real -, separadas por pilastras toscanas que suportam o entablamento. Estas portas dão acesso ao vestíbulo. No segundo corpo rasgam-se três janelas com frontões. Dos lados vêem-se átrios com balaustradas, nos extremos dos quais estão colocadas esculturas de pedra, da autoria de João Albertino de Azevedo.

O interior, de planta de cruz latina, é coberto por uma abóbada de tijolo. As paredes da nave são preenchidas com altares inseridos a em portadas de arco pleno, três de cada lado. Sustentam o coro colunas da ordem coríntia. Nas capelas dos topos do transepto, os retábulos, de estilo neoclássico, são ladeados por nichos sobrepostos. No friso superior figuram as esculturas dos Quatro Evangelistas.

A capela-mor, cujas paredes são revestidas de mármores, ostenta duas ordens de tribunas de cada lado.

IGREJA DA IMACULADA CONCEIÇÃO

igr.imconc.JPG (37421 bytes)É um templo moderno, sagrado em 1947, da autoria do arquitecto contemporâneo P.e Paulo Bellot, monge beneditino. O acesso ao templo faz-se por três ordens de degraus.

A fachada, de granito lavrado, apresenta três portões de ferro forjado e bronze. O central ostenta um relevo com a Coroação da Virgem. Entre o tímpano e as estátuas insere-se um friso de nove janelas com vitrais representando os nove anjos do coro.

A torre sineira, oitavada, tem no alto oito janelas e é rematada por uma cúpula piramidal com uma cruz no vértice. O nártex é pavimentado em mármore lioz e decorado com mármore rosa.

Dá acesso ao baptistério um portão de ferro forjado e bronze com o símbolo do baptismo: um veado. As paredes desta capela são revestidas de mármore e frescos com cenas representativas das origens da Nacionalidade e da epopeia missionária e O Baptismo de Cristo, da autoria de mestre Dordio Gomes.

O interior é de três naves, separadas por duas ordens de colunas que se ramificam, dando origem a arcos. O tecto é formado por nove pequenas abóbadas, no sentido longitudinal, separadas entre si por oito vigas do mesmo comprimento com recortes circulares côncavos. As dez capelas laterais, todas iguais, são de mármores policromos, ostentando nas paredes fundeiras um painel de azulejos com cenas evocativas da devoção dos Portugueses à Virgem Maria. Cada altar suporta um plinto de mármore policromo, sobre o qual assenta uma imagem de pedra de Ançã. As paredes laterais são ornadas de vitrais. Os passos da Via Sacra são representados por pinturas a fresco, da autoria de Guilherme Camarinha.

Os púlpitos, de pedra de Anca, com relevos representando os Apóstolos, devem-se ao escultor Henrique Moreira. Decora o arco cruzeiro o fresco. A Coroação da Virgem, obra do pintor Augusto Gomes. Nas paredes da capela-mor admira-se também uma pintura a fresco representando anjos adoradores.

O altar-mor é formado por um só bloco de mármore preto que assenta sobre oito colunas do mesmo mármore com capitéis de bronze dourado. O trono é de mármore cor-de-rosa, também com decoração de bronze dourado.

IGREJA DE SANTO ILDEFONSO

Image26.jpg (27165 bytes)Edificada sobre os alicerces da vetusta Ermida de Santo Alifou, nos princípios do século XVIII, tem a fachada, barroca, dividida em três corpos por pilastras, sendo a parte central ligeiramente avançada. Os corpos laterais ostentam em linha vertical duas janelas sobrepujadas por frontões e terminam em torres sineiras rematadas, em cada face, por esferas e frontões, erguendo-se a meio pirâmides ornamentais. No corpo central rasga-se a porta, rematada por um frontão triangular. O tímpano ostenta uma inscrição e é encimado por um entablamento denticulado. Sobre ele rasga-se um nicho com uma escultura do padroeiro. Nas paredes admiram-se alguns painéis de azulejos com cenas da vida de Santo Ildefonso e alegorias à Eucaristia, da autoria de Jorge Colaço e data dos de 1932.

O interior é de uma só nave, coberta por um tecto de masseira com estuques. Suspensos ao centro figuram dois grandes quadros, atribuídos a Domingos Teixeira. Nos lados menores rasgam-se nichos com esculturas de gesso. Os altares laterais são neoclássicos, e os colaterais, de talha rococó.

A capela-mor tem o tecto e paredes cobertos por estuques e é rematada superiormente em lanterna. O retábulo, de talha barroca e rococó, data, provavelmente, de 1730. Nele se enquadra um painel representando o padroeiro adorando a Custódia, pintura da autoria de João António Correia (Paris, 1858).

Extratamos também, em relação a esta Igreja, o que se escreveu em «Guia Histórica e Artística do Porto», obra de autoria de Carlos de Passos.

-  "De fundação ignorada e remota é a ermida de Santo Alifon, que, no juízo do Padre Novais (autor do Episcopológico, escripto próximo de 1690), ascendia ao tempo dos godos, cuja opinião formulou por na sua juventude ter visto no cemitério contíguo sepulturas com emblemas dos mesmos. Exagerou, de boa fé, talvez. Porém, existia já no séc. XII, visto que pelo bispo D. Pedro Pitões (1146-52 foi consagrada. Em princípios do séc. XVI estava na posse da confraria do Senhor Jesus; rodeava-a, então, um vasto souto de carvalhos, no qual, debaixo de um dos maiores, se expunha o SS. Sacramento à adoração dos fiéis na procissão de Corpus Christi.

Constituía esse lugar o burgo de Santo Alifon, como o registam as vereações da época. No séc. XVIII a ermida estava arruinada. Afim de ser reconstruida, em 1724 o S.S. mudou-se para a capela de Nossa Senhora da Batalha, já pertencente à Câmara. A obra só em 1730 ficou pronta, segundo a inscrição da porta principal. Todavia, houve necessidade, em 1857, de ampliar a capela-mor, à custa da confraria do SS. Sacramento, instituída em 1634 e logo fundida com a do Senhor Jesus. Então se renovou todo o interior: as paredes foram pintadas com várias figurações pelo cenógrafo Paulo Pizzi, douraram-se os altares, fizeram-se os altares laterais, os estuques ornamentais e as estátuas, de gesso, dos evangelistas e S. Pedro e S. Paulo da capela-mor. Consta que a abóbada fora pintada por Joaquim Rafael (fins do séc. XVIII a princípios do XIX) .

Precede a igreja, uma larga escadaria, em cujo patamar fronteiro à rua de Santo António, se ergueu um obelisco em 24-XII-1794, de significado ignoto. Simples elemento decorativo? Memória da abertura daquella rua? Imponente cascata nella se ornou no dia 24 de Junho de 1810.

Em 1869 recolheram-se no seu cemitério treze cruzeiros pintados com a Crucifixão, de várias invocações, os quais a Câmara retirou das ruas do Bonjardim e Calvário, não sem vivos clamores dos devotos. No local se benzeram no dia 1 de novembro, motivo de gáudio e rija festa com iluminação, fogo, embandeiramentos e filarmónicas.

A fachada, embora correcta de linhas, é desgraciosa. Pertence ao barroco rígido, sóbrio, próximo do classicismo de Herera, pelo que a sua construção em 1724-30 representa uma singular anomalia. Haupt achou-a interessante pela profusão de trechos barrocos do tipo da época de D. Filipe III. Pilastras incaracterísticas dividem-na em três partes, das quais um tanto sobressai a do meio. Na ima fronte, porta e janelas laterais, com frontões triangulares (o da porta com inscrição no tímpano); na cimafronte, janelas laterais e jamelão central, com frontões iguais (da do janelão pende um dentilhão). Grosseiros dentículos pendem do meio do entablamento. Sobre ele ergue-se o nicho do padroeiro, ladeado por pirámides. Aos lados, as torres sineiras, com dentilhões nas cornijas, rematadas em cada face por esferas e frontão de fantasia; do meio delas rompem pirámides ornamentais. Guarnecem as paredes uns 11.000 azulejos de Jorge Colíaço7, com passos da vida de Santo Ildefonso e alegorias da Eucaristia. Constituem, pelo desenho, uma boa obra, mas os seus motivos decorativos não se ajustam ao tipo da fachada.

Acentuada é a singelez da nave, octogonal, de tecto em masseira com estuques ornamentais, repetidos nas paredes. Nestas se fixam dois grandes quadros, emoldurados pomposamente em rocócó; atribuem-se a Domingos Teixeira 9 e representam O Triunfo da Eucaristia e O Antigo Sacrifício. Em 1925 habilmente os restauraram Joaquim Lopes e Victorino Ribeiro. Nos lados menores, nichos com estátuas de gesso. São recentes os altares da entrada. Os laterais, obras do neó-clássico e de talha rocócó os colaterais, todos modestos; nos da esquerda dois painéis fracos - uma Crucifixão e uma Piedade. O painel do baptismo, um Baptismo de Cristo, é de Domingos Teixeira.

A capela-mor dispõe de algum aparato, embora pesado. Bons estuques ornamentais cobrem as paredes e o tecto, aberto em lanterna. A meio das paredes, em nichos emoldurados com estuques abrigam-se as estátuas de gesso, em tamanho avultado, dos evangelistas e de S. Pedro e S. Paulo. No alto, duas tribunas com grades entalhadas e doiradas. Excelente é o retábulo, de talha barroca e rocócó (séc. XVIII, 2º quartel), com anjos, serafins e emblemas no frontão. O painel, apreciável, representa o padroeiro adorando a custódia, segura por uma alegoria de anjos. Foi pintado em Paris e em 1858 por João António Correia ~. Dos paramentos distinguem-se: véo de hombros de lhama, bordado a oiro, com minas novas; sete pluviais de cetim bordado a oiro. Frontal de lhama de bordado a oiro, em relevo. Jogo de sacras de boa talha.

Peças de ourivesaria, das melhores: custódia de prata, rocócó, interessante pelo desenho da haste; cálice de prata doirada, relevada, com os instrumentos da Paixão na copa e na base - em medalhões, a fénix, o cordeiro, o pelicano e a arca da aliança, obra de Francisco Moreira, séc. XIX, princípios; píxide do mesmo género, com serafins, o pelicano e a arca de aliança, em medalhões, no bojo, e uvas, espigas do trigo e flores na base, do dito ourives, decerto; bacia e gomil de prata, de esbelto desenho, princípios do séc. XIX.

CAPELA DAS ALMAS

capela.JPG (16453 bytes)Encravada mesmo no cerne da cidade, onde palpita febril o coração duma urbe plena de movimento e de vida, situa-se a Capela das Almas ex-libris da velha e gloriosa cidade do Porto. É um pequeno-grande templo com traça de estilo neoclássico do séc. XVIII (fins). Correia de Azevedo na sua «Enciclopédia da Arte Portuguesa» escreve assim, resumidamente, mas com uma apreciação muito equilibrada, a Capela das Almas. «Situa-se no ângulo das ruas de Santa Catarina e Fernandes Tomás. Tanto a fachada como a nave são muito equilibradas e sóbrias.

Mas o que neste templo interessa distinguir é o seu completo revestimento exterior a azulejos da fachada e parede lateral Sul. Tais azulejos são da autoria de Eduardo Leite». Como «os santos da porta não fazem milagres» é possível, ou melhor, é certo, que dos milhares de portugueses que diariamente passam pela Capela das Almas e pelas ruas de Santa Catarina e Fernandes Tomás, poucos se apercebe bem da importância e valor artístico dos azulejos. Quem dá por eles? Quem se detém a vê-los com os olhos do corpo e os olhos da alma? Para nossa vergonha são os estrangeiros que, como recordação, costumam

levá-los impressos nos negativos das suas máquinas fotográficas. A fama dos painéis de azulejo da Capela das Almas atravessou fronteiras e espalhou-se pela Europa e pelas Américas. Para confirmar esta asserção cito apenas dois casos. A revista de maior tiragem do mundo a «National Geographic», órgão oficial da National Geographic Society, com sede em Washington (Estados Unidos) chamou a atenção do mundo culto para os azulejos em causa, reproduzindo a cores, de toda a parede do lado Sul da Capela das Almas. Esta reportagem vem no volume 158, n.0 6, de Dezembro de 1980. A Televisão Francesa já estabeleceu contactos para filmar um documentário dos azulejos da e Capela das Almas. Pois os preciosos azulejos da Capela das Almas correram o sério risco de se degradarem, de se perderem para sempre. Foi uma preocupação séria a sua recuperação, que felizmente se fez. Trabalho moroso, difícil, dispendioso, mas que está feito. O restauro começou no dia 1 de Setembro de 1982. Foram levantados e recolocados 2 400 azulejos. Foram feitos de novo, na Fábrica Viúva Lamego, 28 azulejos que se tinham partido quando cairam no pavimento da Rua Fernandes Tomás. No dia 17 de Dezembro de 1982 terminava esta obra delicada e difícil da recuperação dos azulejos.

Os azulejos da Capela das Almas - «obra preciosa pelo aspecto se significado e monumentalidade» estão assinados pelo pintor Eduardo Leite que se notabilizou como aguarelista e ceramista e foram executados pela Fábrica de Cerâmica Viúva Lamego, em Lisboa. Para se  fazer uma pequena ideia da importância destes painéis, basta ter em conta que, no conjunto, foram empregues pintados e cozidos) 15 947 azulejos que cobrem cerca de 360 metros quadrados de parede. Na fachada (do lado da Rua de St., Catarina) são de realçar a imaginação de cenas das «Almas do Purgatório», decorações e quadros alusivos à Eucaristia e composições sobre a vida de Santa Catarina. O painel da parede lateral voltado para a Rua de Fernandes Tomas, tem várias cenas da vida de Santa Catarina e S. Francisco de Assis. Dedicados a Santa Catarina, virgem egípcia de sangue real, martirizada no Monte Sinai, os azulejos apresentam as seguintes cenas:

«coroação de Santa Catarina», «Santa Catarina discute com os sábios de Alexandria» (18 dos quais conseguiu converter, «a vitória de Santa Catarina anunciada por um anjo» e «súplica de Santa Catarina no acto de ser degolada». Dedicado a S. Francisco de Assis, que antes de se entregar ao apostolado de Deus e dos pobres foi guerreiro, filho insubmisso, extravagante, gozador da vida, impulsivo, rebelde, mas sempre generoso, merecem ser admirados com especial atenção as composições: «Cristo solta-se da Cruz para abraçar S. Francisco», «S. Francisco a pregar na presença do Papa Honório III», «S. Francisco faz um milagre» (o da água a brotar duma pedra), «A morte de S. Francisco» e «S. Francisco a ser levado pelos anjos». Tamanha grandeza e beleza que quer queiram quer não faz parte da história da nossa azulejaria e é uma preciosa jóia da azulejaria portuguesa - esteve em perigo de se perder para sempre. Os malefícios do tempo fizeram-se sentir com agressividade ameaçando drasticamente, perigosamente, os magníficos painéis de azulejo da Capela das Almas. Graças a Deus o perigo passou, a recuperação foi possível e os azulejos ali estão patentes em toda a sua frescura e beleza.

Os azulejos da Capela das Almas são uma riqueza que se não pode dimensionar em moeda corrente. O seu valor incalculável não se pode pagar por qualquer preço material. A arte e a beleza não têm preço. Ultrapassam todos os valores materiais. Para se avaliar quanto os azulejos enriqueceram a Capela das Almas basta ver, com atenção, e interesse uma das últimas gravuras deste templo, em reboco, sem os azulejos que hoje possui. É um desenho, por sinal muito bem executado, de Victoria Vila Nova, pseudónimo de Joaquim Carvalho, existente na Biblioteca Municipal do Porto. Por esta gravura se pode verificar que a Capela das Almas sem os seus painéis, parece não ultrapassar a dimensão artística duma vulgar e humilde igreja das nossas aldeias. Mas com os azulejos a Capela das Almas situa-se, sem favor, ao nível dos ex-libris que possui a nossa cidade. E na verdade um pequeno-grande templo.

Nesta Igreja (Capela das Almas) além dos azulejos há ainda valores artísticos que convém não esquecer ou subestimar. O painel do altar mor é digno de ser admirado pela sua beleza, pelo seu equilíbrio, pela suavidade e leveza das figuras que nele aparecem, Nossa Senhora e os Apóstolos. O painel que representa a Ascenção do Senhor é obra do pintor Joaquim Rafael. Mede 5,61 m x 2,13 m. Foi pintado em 1815. Joaquim Rafael nasceu no Porto em 1783 e faleceu em 1864. Foi discípulo de Vieira Portuense e professor de desenho da Academia de Belas-Artes de Lisboa. Pintou também os painéis de Santa Clara, dos Clérigos e da Lapa. Sem querer «puxar a brasa para a minha sardinha» direi que dos três citados o melhor parece ser o da Capela das Almas. Pelo menos para mim. Pois este painel também correu o risco de desaparecer. Após a tomada de posse da Reitoria da Capela das Almas, em 1 de Janeiro de 1953, a minha primeira e séria preocupação foi restituir este painel à sua beleza e verdade pictórica primitivas, adulteradas por pessoas sem gosto e sem escrúpulos. Na verdade sobre a autêntica e verdadeira pintura de Joaquim Rafael foi repintada outra Ascenção do Senhor, sem beleza alguma, obra de qualquer artista sem nome e sem valor. Foi necessário retirar a segunda camada de tinta, destruir a segunda pintura para que ficasse apenas (e SÓ) a primeira. Foi uma obra morosa, difícil e delicada, na qual já nessa altura foram investidas algumas dezenas de contos. Graças ao saber e à paciência do pintor Mendes da Silva o painel da Capela das Almas foi restituído à sua beleza primitiva tal qual saiu das mãos do pintor Joaquim Rafael. É o painel que actualmente lá está, que sem favor, confere ao pintor Joaquim Rafael o aval dum grande artista e dum grande valor da pintura portuguesa (que não é rica em valores). O vitral da fachada também merece uma referência. Está assinado pelo pintor e professor da Escola de Belas--Artes do Porto, Amándio Silva. Tem uma simbologia perfeitamente enquadrada no dogma da redenção dos homens pelo sangue de Cristo. Representa um braço de Cristo, pregado na cruz, brotando da chaga da mão várias gotas de sangue que caem sobre as almas do purgatório. É um vitral no qual o artista pôs um carinho e interesse especiais (eu acompanhei a obra e a sua feitura) e que resultou muito bem. Para além destes motivos artísticos enumerados julgo dever assinalar duas imagens de Nossa Senhora: Nossa Senhora da Hora e Nossa Senhora das Almas. Esta imagem de N.Srª' das Almas, é obra do século XVIII, tem muita beleza e sobriedade. É curioso que esta representação icnográfica, bastante usada na época, aparece-nos na imagem de N.' 5.' da Lapa, muito semelhante a esta e numa imagem que existe na igreja paroquial de Castro Laboreiro que é perfeitamente igual à da Capela das Almas, excepto na peanha que não tem qualquer representação das almas do purgatório. Estas são, a meu ver as peças de maior valor artístico da Capela das Almas de Santa Catarina, templo de estilo neoclássico do século XVIII. O documento mais antigo que se encontra no arquivo da Capela das Almas é uma referência ao Breve Pontifício do Papa Pio VI, datado de 26 de Agosto de 1795, com Beneplácito Régio da Senhora D. Maria l em que se concede «uma indulgência plenária a todos os fiéis de ambos os sexos, que com as devidas disposições receberam o Santíssimo Sacramento da Eucaristia no dia em que entrarem para Irmãos da Venerável Irmandade das Almas do purgatório erecta na Capela de Santa Catarina desta cidade». A entidade que superintende na Capela das Almas é a Venerável Irmandade das Almas e Chagas de 5. Francisco. Erecta na igreja de Santa Clara, nos fins do século XVIII, passou para a Capela de Santa Catarina. A festa principal é a do aniversário da Instituição do Sagrado Lausperene no dia da Ascenção do Senhor. o Lausperene era (e é ainda) em todas as Quintas Feiras do ano e foi autorizado por Breve Pontifício de 1804. A Festa principal desta Igreja é a Ascenção do Senhor, motivo pictórico do painel do artista Joaquim Rafael.

(Texto de P.e Alexandrino Brochado).